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DNA antigo conta nova história sobre o povo de Luzia

Nem bem foi recuperada dos escombros do Museu Nacional, destruído por um incêndio no início de setembro, Luzia, o fóssil humano mais antigo do Brasil, deverá ganhar uma nova face. Pelo menos é o que sugerem duas equipes internacionais de pesquisadores, que sequenciaram e analisaram o genoma de antigos habitantes das Américas para traçar um novo mapa e cronologia da ocupação do continente. Os estudos foram publicados nesta quinta-feira nos periódicos “Science” e “Cell”.

 

Segundo os cientistas, os dados genéticos contrariam a tese de que Luzia e seu povo, que habitaram a região de Lagoa Santa, Minas Gerais, há cerca de 10 mil anos, integrariam um grupo denominado paleoamericanos, descendentes de uma onda migratória de uma população de origem australo-melanésia, anterior aos ancestrais dos indígenas atuais da região.

Formulada com base principalmente em diferenças de medidas do crânio em comparação com os chamados ameríndios antigos e atuais, a teoria dos paleoamericanos tem entre seus principais defensores o pesquisador brasileiro Walter Neves, e guiou a confecção da conhecida reconstrução facial de Luzia com marcantes traços negroides, como os observados nos aborígenes australianos.

Mas, embora os exames de DNA descartem esta ascendência australo-melanésia direta no povo de Luzia, em um dos sete integrantes que tiveram seu genoma sequenciado os cientistas detectaram variações genéticas associadas às populações da atual Oceania. Segundo os pesquisadores, porém, este sinal, além de único, é muito fraco.

— Se o povo de Luzia de fato representasse os descendentes destes paleoamericanos, este sinal genético teria que ser mais presente e muito maior que os 3% encontrados — argumenta André Strauss, pesquisador do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP), um dos autores sêniores do estudo na “Cell” e único cientista que assina ambos artigos. — Para nós está claríssimo que o povo de Lagoa Santa é tão ameríndio quanto qualquer outro do continente. Assim, não faz mais sentido imaginar o rosto de Luzia com os traços africanos que conhecemos. Eles são meros artefatos artísticos para os quais não há nada de indicativo em sua anatomia craniana e sem dúvida precisamos buscar uma nova face para Luzia.

Por outro lado, as análises do genoma dos integrantes do povo de Luzia indicam uma forte conexão com a chamada “Cultura Clóvis”, população que está entre as primeiras ocupantes da América do Norte, sugerindo uma antes desconhecida e tardia migração desta para a América do Sul. Além dos restos de Lagoa Santa, apresentam esta afinidade fósseis encontrados na região de Mayahak Cab Pek, no Belize, América Central, e de Los Rieles, no Chile. E, assim como o povo de Luzia, estes também sumiram aparentemente sem deixar descendentes entre os povos nativos americanos atuais.

 

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